Fonte: Portal exame
Uma nova geografia impera no planeta. Agora são as principais metrópoles que se firmam como os grandes centros de decisão e articulação do sistema capitalista.
São Paulo: melhorar o trânsito e investir na qualidade de vida é essencial para que a cidade retenha a mão-de-obra mais qualificada.
EXAME Ao contrário do que diz o jornalista americano Thomas Friedman, autor do best-seller O Mundo É Plano, para quem vive em Londres, Nova York ou São Paulo, a globalização está tornando o mundo cada vez mais vertical. A inspirada metáfora de Friedman ilustra bem o processo de globalização do ponto de vista dos países e serve para mostrar que, graças ao avanço tecnológico, ao histórico declínio do protecionismo e à queda dos custos de transporte e comunicação, a competição entre nações ricas e emergentes nunca foi tão nivelada. Mas a imagem do mundo plano não capta um fenômeno que está criando uma nova geografia neste início de século. Em meio à vasta planície, despontam cerca de 40 picos -- as cidades globais. Quem já viu a paisagem do alto de um arranha-céu de Manhattan, da City londrina ou mesmo da marginal Pinheiros sentiu na pele a vertigem de estar no topo de uma das metrópoles mais prósperas, inovadoras e influentes.
Uma nova geografia impera no planeta. Agora são as principais metrópoles que se firmam como os grandes centros de decisão e articulação do sistema capitalista.
São Paulo: melhorar o trânsito e investir na qualidade de vida é essencial para que a cidade retenha a mão-de-obra mais qualificada.
EXAME Ao contrário do que diz o jornalista americano Thomas Friedman, autor do best-seller O Mundo É Plano, para quem vive em Londres, Nova York ou São Paulo, a globalização está tornando o mundo cada vez mais vertical. A inspirada metáfora de Friedman ilustra bem o processo de globalização do ponto de vista dos países e serve para mostrar que, graças ao avanço tecnológico, ao histórico declínio do protecionismo e à queda dos custos de transporte e comunicação, a competição entre nações ricas e emergentes nunca foi tão nivelada. Mas a imagem do mundo plano não capta um fenômeno que está criando uma nova geografia neste início de século. Em meio à vasta planície, despontam cerca de 40 picos -- as cidades globais. Quem já viu a paisagem do alto de um arranha-céu de Manhattan, da City londrina ou mesmo da marginal Pinheiros sentiu na pele a vertigem de estar no topo de uma das metrópoles mais prósperas, inovadoras e influentes.
Longe de operar isoladamente, essas metrópoles formam uma rede altamente hierarquizada, governada pelos princípios opostos de competição e cooperação. "As cidades globais são os centros de comando do sistema capitalista", diz o geógrafo Peter Taylor, diretor do grupo de estudos Globalização e Cidades Mundiais (GaWC, na sigla em inglês). "Cabe a elas controlar e articular a produção mundial." Sediado na Universidade de Loughborough, em Liverpool, na Inglaterra, o GaWC é responsável pelo ranking de cidades globais utilizado por EXAME para ilustrar esta e as próximas páginas. Nesse pelotão de elite, Londres e Nova York surgem praticamente empatadas como as "capitais do mundo", seguidas por Hong Kong, Paris, Tóquio e Cingapura. Na América Latina, São Paulo emerge como o principal centro financeiro, corporativo e mercantil.
Da perspectiva da atividade econômica, a imensa riqueza gerada por essa teia urbana destaca-se do resto do mundo. Segundo estudo da consultoria PricewaterhouseCoopers, em 2005 as 30 cidades mais globalizadas somavam 260 milhões de habitantes, ou apenas 4% da população mundial. Mas, juntas, geraram 9,8 trilhões de dólares, ou 16% do produto bruto global, medido pela paridade do poder de compra. Tal pujança -- que tende a crescer cada vez mais nos próximos anos -- deve-se à hegemonia do setor de serviços: seus mercados financeiros e sedes corporativas, suas consultorias, firmas de contabilidade, advocacia e tecnologia, suas escolas, universidades e hospitais, seus conglomerados de mídia e equipes esportivas, seus museus, orquestras, teatros e bandas de rock e, ainda, suas lojas, restaurantes e hotéis. Como diz o cineasta e ensaísta americano Eric Burns, as cidades globais são o "laboratório humano supremo". Nelas, a civilização faz suas apostas mais audaciosas, engendrando fusões corporativas, decifrando o código genético e criando obras-primas. "As cidades estão se tornando cada vez mais incubadoras de mudanças e líderes da inovação", escreveu Michael Bloomberg, prefeito de Nova York, em recente artigo publicado na revista The Economist.
Embora muitas delas, como Nova York, Frankfurt e São Paulo, não sejam a capital de seus países, as decisões tomadas numa cidade global, seja a fixação do preço do petróleo, seja a proibição do fumo em lugares públicos, têm o poder de reverberar pelo mundo. "Essas cidades exibem dois traços fundamentais, o capital humano e a densidade", diz o americano Edward Glaeser, professor de Harvard e uma das maiores autoridades em economia urbana. "Antes, elas viviam das fábricas e do comércio, mas hoje seu principal motor econômico está nas idéias de sua força de trabalho. E é a densidade demográfica que possibilita a convivência, fator crítico para a criação e a dispersão das idéias."
As mais globalizadas
Londres é a líder de um rankingdas cidades que se destacam pela influência na economia mundial e pela capacidade de interagir com outros centros de decisão globais. São Paulo é a 14a colocada nesta lista
1º Londres
População 8,5 milhões de habitantes
PIB 452 bilhões de dólares
Vocação A abertura econômica, a eficiência do sistema financeiro e uma infra-estrutura impecável fazem com que a capital do antigo Império Britânico leve o título de cidade mais globalizada do planeta
2º Nova York
População 18,7 milhões de habitantes
PIB 1,1 trilhão de dólares
Vocação Apesar de ter perdido o posto simbólico de capital do mundo para Londres, a Big Apple conta com trunfos formidáveis, como Wall Street, imensos conglomerados de mídia e uma colossal indústria do turismo
3º Hong Kong
População 7 milhões de habitantes
PIB 244 bilhões de dólares
VOCAÇÃO A antiga colônia britânica abriga uma grande população de executivos transnacionais e o maior número de filiais asiáticas das maiores firmas globais
4º Paris
População 9,8 milhões de habitantes
PIB 460 bilhões de dólares
Vocação Maior destino turístico do planeta, a capital francesa, que é sinônimo de altacostura, gastronomia e beleza arquitetônica, também sedia empresas de alta tecnologia
5º Tóquio
População 35,2 milhões de habitantes
PIB 1,2 trilhão de dólares
VOCAÇÃO Cidade mais populosa do mundo,Tóquio é também o maior mercado consumidor e o maior centro financeiro e de negócios da Ásia
6º Cingapura
População 4,8 milhões de habitantes
PIB 129 bilhões de dólares
Vocação Acidade-estado, criada por refugiados chineses, tem uma economia baseada nos serviços, na indústria hi-tech e no porto, um dos mais eficientes do mundo
7º Toronto
População 5,3 milhões de habitantes
PIB 209 bilhões de dólares
Vocação Célebre pela qualidade de vida, Toronto é o principal pólo empresarial do Canadá. Seu sucesso é um poderoso atrativo para estrangeiros, metade de sua população
8º Chicago
População 8,8 milhões de habitantes
PIB 460 bilhões de dólares
Vocação Alocalização estratégica no Meio-Oeste americano fez de Chicago a referência mundial em commodities. Também é sede de empresas de tecnologia
9º Madri
População 5,6 milhões de habitantes
PIB 188 bilhões de dólares
Vocação Porta de entrada de grupos latinoamericanos na Europa, a capital espanhola é a maior, mais rica e etnicamente mais diversa metrópole da região ibérica
10º Frankfurt
População 5,6 milhões de habitantes
PIB 188 bilhões de dólares
Vocação Sede do Banco Central Europeu, a cidade é o maior centro financeiro da Europa continental.Frankfurt também realiza boa parte das maiores feiras comerciais do mundo
11º Milão
População 7,4 milhões de habitantes
PIB 115 bilhões de dólares
Vocação Tradicional centro industrial, financeiro e tecnológico, Milão tornou-se a capital mundial do de sign.Hoje passa por um renascimento arquitetônico
12º Amsterdã
População 742 000 habitantes
PIB 42 bilhões de dólares
Vocação Sede de corporações holandesas e famosa pela liberalidade de costumes, é o maior mercado do norte europeu.Comercializa de produtos agrícolas a diamantes
13º Bruxelas
População 1 milhão de habitantes
PIB 39 bilhões de dólares
Vocação Antes decadente, Bruxelas renasceu depois de 2003, quando foi escolhida para ser a capital da União Européia.Também sedia a Organização do Tratado do Atlântico Norte
14º São Paulo
População 18,3 milhões de habitantes
PIB 225 bilhões de dólares
Vocação Cidade mais populosa do hemisfério sul, São Paulo é o principal motor econômico-financeiro e centro de decisões corporativas da América Latina.
Antes da internet, a difusão das idéias entre os principais centros do planeta limitava-se ao envio de cartas, ao telefone e às viagens internacionais. Hoje, na era da fibra óptica, um dos principais indicadores do nível de globalização de uma cidade é a capacidade de transmissão de dados, medida em bits por segundo (bps). Além de servir o usuário comum da internet, tais redes são as vias expressas pelas quais trafegam as informações que irrigam os pregões globais. Segundo a consultoria americana TeleGeography, Londres desponta como a campeã mundial da banda larga, com capacidade instalada de 2,35 trilhões de bits por segundo (Tbps). A seguir vêm Paris, com 1,7 Tbps, e Frankfurt, com 1,3 Tbps. Nova York está em quarto lugar, com 1,2 Tbps, e São Paulo em 20o, com 0,17 Tbps. "Os números revelam a decisão dessas cidades e seus países em investir em redes de fibra óptica com o intuito de ser os principais pontos de conexão, os hubs, das redes de transmissão mundial", diz Eric Schoonover, analista da TeleGeography. Nova York perde para Londres e Paris porque integra uma rede de sete hubs americanos. Londres e Paris são os únicos hubs do Reino Unido e da França.
Aliás, a competição pelo posto de cidade global número 1 nunca esteve tão acirrada nos dois lados do Atlântico Norte. Após ter sido superada por Nova York no final dos anos 30, Londres foi à forra e acaba de retomar o trono de "capital do mundo". É o que atestam dois estudos publicados neste ano -- pela consultoria McKinsey e pela Mastercard --, além de relatórios anteriores do GaWC que já indicavam o mesmo resultado. No ano passado, a vitória londrina sobre Nova York para sediar a Olimpíada de 2012 já significou um duro golpe na vaidade ianque. Com o ego massageado, agora os londrinos investem 34 bilhões de dólares na infra-estrutura dos Jogos. Em maio, Nova York tomou a segunda pancada, com as conclusões de um relatório da McKinsey encomendado pelo prefeito Bloomberg para medir a competitividade de Wall Street. O estudo revelou que, em razão do excesso de litígios, de maior protecionismo pós 11 de Setembro e de uma moldura regulatória antiquada, Nova York está ficando para trás em setores como bancos de investimento.
UM MES DEPOIS, A MASTERCARD PUBLICOU o Índice Mundial de Centros de Comércio, que avalia critérios como legislação local, facilidade de fazer negócios, estabilidade econômica e infra-estrutura urbana. Mais uma vez, Londres chegou na frente. Numa escala de 1 a 100, marcou 77,8 pontos, enquanto Nova York fez 73,8. "Temos hoje o maior mercado de câmbio do mundo e executamos mais de 70% das vendas de títulos de dívida", diz Mary Palmer, diretora da agência de promoção comercial londrina. A disputa mereceu capa da revista americana Fortune, para quem "Londres encontrou a fórmula mágica. Ela se abriu para o mundo, e o mundo atendeu a seu chamado".
Abertura, aliás, é uma marca de todas as cidades com aspirações globais. Não apenas na receptividade dos melhores talentos -- estima-se que em Londres 300 idiomas sejam falados -- mas também na integração com outras metrópoles. Nova York conta com essa integração para retomar o cetro perdido. Em 2006, a Bolsa de Valores de Nova York (Nyse) venceu os britânicos na briga pela fusão com a Euronext, grupo francês que reúne as bolsas de Paris, Amsterdã, Bruxelas e Lisboa. Hoje, a Nyse-Euronext é a maior rede de pregões mundiais. Agora, Bloomberg e o secretário do Tesouro americano, Henry Paulson, buscam apoio no Congresso para reformar as leis financeiras e, assim, melhorar a competitividade da cidade. E, como era de esperar, a Big Apple não admite a derrota. "Continuamos comprometidos com a qualidade de vida, a segurança, o ambiente e a infra-estrutura que contribuem para a primazia global de Nova York", diz Laure Audubon, vice-presidente da agência de desenvolvimento da cidade.
Se for possível disseminar certo nível de prosperidade em escala planetária, tudo indica que as cidades globais mais eficientes verão sua liderança aumentar. De certa forma, isso já ocorre no mercado financeiro. Segundo a Fortune, os melhores pregões emergentes, em cidades como Xangai, Mumbai, Dubai e, é claro, a Bovespa, em São Paulo, estão bem posicionados para desafiar no futuro a City londrina e Wall Street. "Teremos uma órbita de quatro ou cinco centros financeiros dominantes e alguns outros pontos-chave em torno deles", prevê a revista. Contudo, para consolidar-se como metrópole global, São Paulo tem uma árdua lição de casa pela frente -- diminuir congestionamentos, poluição e criminalidade. O índice da Mastercard acusou a precariedade da infra-estrutura paulistana. São Paulo ficou em 48o lugar no ranking, atrás da Cidade do México e de Santiago do Chile. Segundo o relatório, nas cidades globais, "juntos, as empresas e seus empregados têm níveis de produtividade bem mais altos do que se estivessem dispersos e trabalhando por conta própria". Mas, diariamente, o paulistano convive com a máxima do filósofo francês Jean-Paul Sartre, para quem "o inferno são os outros". Portanto, para evitar uma debandada da mão-de-obra mais qualificada, gente que põe a qualidade de vida no topo de suas aspirações, São Paulo precisa se tornar mais habitável. "Sua prioridade deve ser atacar os congestionamentos", afirma Edward Glaeser. Para ele, São Paulo deve investir em transporte público e seguir o exemplo de Londres, cobrando pedágio dos motoristas na região central.
Mas, para além de problemas concretos do dia-a-dia, a capital paulista tem de vencer a histórica deficiência brasileira na formação da mão-de-obra. "A única solução duradoura é o investimento em educação", diz Glaeser. Para complicar, é importante que o restante do país acompanhe o passo -- algo que já está ocorrendo --, para que não se repita o fenômeno de inchaço de décadas passadas. "Se São Paulo aliviar a pobreza isoladamente, atrairá mais pobres com baixo nível de escolaridade. Essas pessoas iriam parar nas favelas." Mas isso não quer dizer que deva haver um esforço de limitar o crescimento, o que poderia inflar o preço dos imóveis, tornando-a menos competitiva. O ponto é que o crescimento deve ser saudável. Nas últimas décadas, a cidade teve sucesso na transição de locomotiva fabril para cabine de comando da economia brasileira. Hoje, a Grande São Paulo responde por 15% do produto interno bruto brasileiro, uma cifra formidável quando se considera o crescimento das demais regiões do país. De agora em diante, a questão é saber se conseguirá se manter -- e quem sabe galgar posições -- no pelotão de elite das cidades globais, as novas detentoras do poder neste início de século.
29/11/2007
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