01 agosto 2007

CONSTRUÇÃO - A febre imobiliária da internet

Fonte: Portal EXAME
Por Ricardo Cesar

Para Pietro Rocchi, proprietário de uma companhia que negocia planos de saúde na região de Jundiaí, no interior de São Paulo, escolher imóveis pela internet virou rotina. Há cerca de quatro anos, o empresário compra apartamentos na capital paulista como uma forma de investimento. Não demorou para ficar claro que a web era a maneira ideal de garimpar as melhores oportunidades. Hoje, Rocchi recebe quase 150 e-mails mensais com detalhes de lançamentos que podem ser de seu interesse, além de dedicar algumas horas semanais a navegar pelos sites das maiores construtoras e incorporadoras do país. Foi assim que ele adquiriu dois apartamentos próximos à avenida Paulista, um na rua Oscar Freire, outro vizinho da avenida Rebouças e um quinto em frente ao Parque do Ibirapuera. O analista de sistemas Daniel Casares, de 25 anos, tem um perfil bem diferente. Em janeiro, decidido a comprar seu primeiro imóvel, ele começou a pesquisar empreendimentos compatíveis com sua renda. Num domingo à tarde, enquanto navegava na internet, entrou na página da construtora Setin e conversou via chat com um atendente que lhe mostrou algumas opções. Nos dias seguintes, recebeu por e-mail informações detalhadas de algumas unidades que atendiam a suas expectativas. Um mês depois, Casares assinava o contrato de compra de um apartamento no bairro do Mo rumbi, em São Paulo.

Assim como Rocchi e Casares, milhares de pessoas estão usando a internet como canal preferencial para procurar e iniciar o processo de compra de imóveis. Não há um número exato, mas cerca de um em cada cinco negócios fechados pelas maiores construtoras e incorporadoras é decorrência de um atendimento que começou online, via chat ou e-mail. Isso fez da web um canal responsável por al go em torno de 2 bilhões de reais em vendas de imóveis residenciais no ano passado apenas na região metropolitana de São Paulo. E não há dúvidas de que esse montante cresce velozmente. Em 2006, a Cyrela, uma das construtoras com atuação mais agressiva na rede, vendeu 200 milhões de reais com o auxílio da internet. Embora a empresa não confirme oficialmente, só na primeira metade deste ano o número saltou para 320 milhões de reais. Esses dados consideram apenas imóveis que de fato começaram a ser negociados online. Embora seja a melhor, essa não é a única forma de medir a dimensão que a internet está tomando para o setor. Muitos apartamentos são descobertos por seus futuros proprietários durante uma navegação nos sites das construtoras, mas, por um ou outro motivo, os interessados preferem estabelecer contato por telefone ou pessoalmente. Um levantamento da Setin mostra que 89% das pessoas que chegam ao plantão de vendas de um imóvel consultaram o produto previamente no website da empresa -- número que, com pequenas variações, repete-se em quase todas as grandes construtoras.
É claro que comprar apartamentos na internet não é a mesma coisa que adquirir um livro, um DVD ou uma batedeira em varejistas eletrônicos como Amazon ou Americanas.com. No caso do imóvel, os últimos estágios de negociação sempre exigem a presença física das partes interessadas, e a transação nunca é efetuada online. Trata-se de uma venda que envolve valores elevados, muita burocracia e, não raro, financiamento bancário. Isso, contudo, não significa que a importância da rede seja secundária nesse mercado. "A venda não é efetuada pela internet, mas é aí que ela pode ser conquistada ou perdida", diz Rafael Rossi, responsável pelo marketing institucional da construtora Rossi. "A web será cada vez mais o ambiente no qual os clientes decidirão suas compras." Para se preparar, a Rossi está investindo na reestruturação de seu site, que hoje é o ponto de partida de 20% dos negócios que a empresa fecha.

Não é difícil entender por que esse movimento está acontecendo. A rede mundial é o canal de vendas que proporciona o menor custo de captação de clientes. Tanto que, do orçamento de marketing de 30 milhões de reais da Tecnisa, apenas 2 milhões de reais vão para a web. O retorno? Quase um terço das vendas -- por enquanto, já que a participação da internet não pára de aumentar. Mesmo a gigante Cyrela gasta 6 milhões de reais online, o que parece uma pechincha para quem deve bater, com folga, a marca de meio bilhão de reais em vendas iniciadas via atendimento eletrônico neste ano. Na Setin, a verba para a web não passa de 5% do total. Há, portanto, uma flagrante desproporção entre o que a internet significa para as vendas das construtoras e quanto é investido nesse meio.

Os custos tornam-se ainda mais baixos porque tudo é terceirizado, desde a manutenção dos sites até os profissionais que fazem atendimento via chat. A Tecnisa, por exemplo, fechou um acordo para o desenvolvimento e a atualização de sua página virtual com um fornecedor de Curitiba, que cobra menos da metade do preço estabelecido por empresas similares em São Paulo. Na maioria dos casos, o atendimento eletrônico só passa aos profissionais da própria construtora após uma filtragem inicial feita por operadores da central de atendimento. Isso elimina os curiosos e otimiza o tempo da equipe de vendas. "Os corretores pegam os melhores contatos pela internet e só convidam o interessado para ir ao plantão quando a conversa está avançada", afirma o diretor de marketing da Tecnisa, Romeo Busarello. "Fica tudo mais eficiente."

Pela web, as construtoras conseguem munir os potenciais clientes de um amplo cardápio de informações. Os sites empregam diversos recursos para seduzir os interessados, desde fotos até representações em três dimensões, vídeos e serviços de mensagem em tempo real. A Tecnisa chegou a criar uma área dentro do Second Life, espécie de jogo online que simula um mundo virtual -- e o mais surpreendente é que dois apartamentos já foram vendidos dessa forma. "A idéia é que o comprador procure a empresa já bem munido de informações", diz Luiz Turano, diretor-geral da Oficina da Imagem, agência de marketing que se especializou na construção de sites de imóveis e tem 40 construtoras como clientes. Uma delas é a Gafisa, que fecha um em cada três negócios no Rio de Janeiro com a ajuda da internet.

A web também é uma comodidade para o cliente. Uma das vantagens é a possibilidade de tirar dúvidas via chat fora do horário comercial. A Tecnisa oferece serviço de corretores online das 8 horas da manhã até a meia-noite, "porque os hábitos estão mudando", explica Busarello. Atualmente, 16% do tráfego no website da empresa é registrado após as 21 horas. A internet facilita ainda o atendimento a clientes de outras cidades e até do exterior. No ano passado, 6% das vendas online da Tecnisa foram para pessoas que moram fora do país. E o conforto não acaba com a assinatura do contrato. Os melhores sites oferecem serviços de pós-venda, como histórico das parcelas já pagas e o que falta para quitar a dívida ou fotos atualizadas mensalmente que mostram o estágio da construção de imóveis comprados na planta. Para o chefe de análises da Bradesco Corretora, Carlos Firetti, a migração para a internet também está relacionada com a onda de abertura de capital do setor nos últimos 12 meses -- hoje, 16 empresas dessa área estão na Bovespa. Esse movimento está concentrando os lançamentos nas mãos das construtoras que conseguiram se capitalizar em bolsa. "São justamente as maiores, que têm sites bem estruturados. Talvez por isso as compras estejam naturalmente passando para o meio online", diz.

Essa montanha de vantagens, entretanto, não significa que a web seja a solução para todas as necessidades das construtoras. A publicidade offline ainda é extremamente importante. Uma prova disso é a audiência dos sites, que costuma aumentar muito na segunda-feira graças à blitz de mídia dos fins de semana. Esse casamento de meios de comunicação é o que se chama de cross media no jargão dos marqueteiros. Por enquanto, essa parece a receita ideal para que cada vez mais consumidores como Rocchi e Casares usem a internet para decidir onde e como -- e com quem -- comprar um imóvel. Quem diria que a nova febre imobiliária ocorreria num lugar onde o espaço é infinito.
26.07.07

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