13 maio 2009

SUSTENTABILIDADE - Qual é a sua pegada?

Fonte: Warner Bento Filho, de Los Angeles (EUA) / Portal AMANHÃ

Consultor em sustentabilidade de companhias como a Coca-Cola e a G&E, o norte-americano Joel Makower lança uma advertência às empresas que não medem seus impactos climáticos: elas ficarão para trás












Joel Makower é uma espécie de guru do marketing ambiental nos Estados Unidos. Ele trabalha, há mais de 20 anos, para empresas como Levi Strauss, General Electric, Nike e Coca-Cola. Agora, Makower reuniu parte dessa experiência e uma série de conselhos em livro publicado com papel 100% reciclado, Strategies for the Green Economy (Estratégias para a Economia Verde). 

Nesta entrevista, concedida nos Estados Unidos com exclusividade para AMANHÃ, Makower alerta para a necessidade de as empresas se adaptarem às novas exigências de mercado, que incluem a adoção de processos sustentáveis. "Venda produtos que melhorem a vida das pessoas e que não prejudiquem o planeta. Existem grandes mercados ao redor do mundo para produtos assim", conclama Makower. Por enquanto, o livro está disponível apenas em inglês e não há planos para sua edição no Brasil - "mas isso é uma possibilidade", avisa.

É realmente possível conciliar grandes investimentos de megaempresas com a sustentabilidade? 
Acho que tem de ser possível. Caso contrário, não conseguiremos sobreviver como planeta. As empresas são hoje a maior força na maior parte do mundo - mais do que governos, cidadãos ou outros. Existem dramáticas transformações ocorrendo nas formas de criar e de utilizar energia, materiais, transporte, até mesmo água, que terão impactos significativos sobre a operação dos negócios nos próximos anos. Isso me faz esperançoso.

Barack Obama anunciou importantes alterações na política ambiental dos Estados Unidos. Já é possível medir a magnitude da mudança? 
Ainda é muito cedo para medir a dimensão das mudanças que estão sendo implementadas por Obama e pelo Congresso. A maior parte das medidas ainda está sendo elaborada e elas provavelmente sofrerão mudanças consideráveis até serem aprovadas. Por exemplo, ainda não sabemos se a regulação da emissão de gases estufa se dará por meio de um sistema de comércio de créditos de carbono (cap-and-trade) ou se teremos um imposto sobre a emissão de gases. O primeiro é mais eficaz e justo, mas o outro é politicamente mais popular. Levará anos para que se possa concluir sobre os efeitos disso na indústria de automóveis, por exemplo. 
O importante, por enquanto, é que pela primeira vez os Estados Unidos têm um presidente que reconhece tanto os grandes desafios quanto as grandes oportunidades trazidas pela questão ambiental.

Como a crise financeira global pode ajudar as empresas a se tornarem sustentáveis?
A recessão e a crise financeira impactam os negócios verdes de duas maneiras: por um lado, exigem mais eficiência - é necessário torcer cada centavo para extrair das receitas o seu máximo valor. Então, a redução do gasto de energia e o combate a desperdícios é crucial em tempos difíceis. De outro lado, o atual congelamento dos mercados de crédito não dá às empresas condições de investir em tecnologias novas e mais eficientes. Por isso, elas estão adiando a instalação de painéis solares, a utilização de veículos híbridos e de uma série de equipamentos mais eficientes. Mas, na comparação desta crise com outras dos últimos 20 anos, há uma boa notícia: nas recessões anteriores, técnicos ambientais estavam entre os primeiros a serem demitidos pelas empresas. Isso não acontece agora. Líderes ambientais estão mantendo os seus postos de trabalho nas grandes empresas, embora os seus orçamentos estejam sofrendo cortes e eles não estejam contratando tantas pessoas quanto antes. Isso sugere que os departamentos ambientais são, agora, parte da estrutura das empresas.

Como o processo de aquecimento global pode prejudicar as empresas e o que elas deveriam fazer para evitar mais problemas?
As empresas que ainda não entenderam sua pegada de carbono - as diversas atividades que contribuem para a emissão de gases estufa - correm o risco de ficar para trás na economia verde. As empresas que pretendem ser competitivas precisarão não apenas medir e entender seus impactos climáticos, mas ter um plano definido para reduzi-los - e devem ser capazes de comunicar isso a clientes, ativistas ou quaisquer outros interessados. As mudanças climáticas impõem uma série de riscos para as empresas - da mesma maneira que para todos nós. A probabilidade de ocorrência excessiva de secas, calor, frio, enchentes e outras condições meteorológicas severas poderá perturbar o transporte e o comércio, ou exigir rápidas mudanças na concepção de produtos e serviços. Veja o caso da água, por exemplo, que está embutida em praticamente todos os produtos que compramos. Conforme a disponibilidade hídrica se torna ameaçada devido a secas ou à contaminação provocadas pelas alterações climáticas, aumentam drasticamente custos e riscos para as empresas. Alterações climáticas - juntamente com o crescente interesse pela eficiência energética - também estão oferecendo novas oportunidades para empresas de transferência tecnológica criarem produtos e serviços que terão procura num mundo em processo de mudança climática.

Os consumidores parecem exigir das empresas que elas tomem medidas em direção à sustentabilidade. O senhor acredita que esta é uma tendência?
Não creio que os consumidores estejam pressionando muito as empresas a serem mais ecológicas e mais sustentáveis - pelo menos não a maioria dos consumidores. O nicho de consumidores que se importam com isso é relativamente pequeno. A grande maioria não está disposta a mudar. As coisas são diferentes no mercado entre empresas. A cadeia de fornecedores sofre pressões de companhias como o Wal-Mart e outros grandes varejistas. Eles forçam os fabricantes a reduzir continuamente embalagens, utilização de energia e outros recursos e a toxidade dos seus produtos. Isso está obrigando as empresas a analisar sistematicamente os seus produtos, processos e embalagens. Muitas dessas melhorias beneficiam os consumidores, mas elas não são feitas em função de demanda dos consumidores.

Por que é tão difícil para consumidores e empresas adotar padrões mais sustentáveis?
Mudar é difícil para os indivíduos e para as empresas da mesma maneira. Mais iniciativas ambientais requerem mudanças nas compras e nos hábitos. É simples assim.

Para as empresas, isso significa mais custos?
Depende. Como eu disse, a adoção de medidas ambientalmente responsáveis pode significar corte de custos, eliminando desperdícios e melhorando a eficiência, entre outras coisas. Mas isso não é verdade para todas as companhias. Em alguns casos, exige investimentos difíceis para empresas sem capital suficiente, o que agora se tornou mais complicado com o congelamento dos mercados de capitais. 
Grandes indústrias, como fornecedoras de gás ou eletricidade, ou fabricantes de aço e alumínio, talvez precisem gastar milhões de dólares para retroalinhar suas unidades, e estes investimentos podem levar anos para serem quitados. 
Por outro lado, algumas empresas descobrem que podem produzir a mesma quantidade de produto com menos energia e menos matérias-primas, tornando-se mais competitivas. Outras percebem que o reconhecimento como ecológicas colabora para atrair clientes, o que ajuda a incrementar as vendas.

Na sua opinião, quais estratégias de marketing verde são mais efetivas?
Não há uma estratégia de tamanho único para o marketing verde. Mas, em geral, a regra mais importante é ser honesto. Isso soa como um lugar comum, mas as empresas estão continuamente tentando "esticar" a verdade. Elas fazem propaganda enganosa e utilizam termos que não têm qualquer significado, como "ambientalmente segura". São termos que não encontram nenhuma definição legal. As pessoas querem especificidades, não generalidades. Isso não significa que você tenha de listar uma série de informações técnicas. A maioria das pessoas não vai entendê-las. As pessoas gostam de uma boa história, que fale ao mesmo tempo de fatos e de aspirações. Isso vai inspirar o consumidor a comprar o seu produto ou serviço. Outra dimensão da honestidade tem a ver com o contexto - isto é, prover alguma perspectiva quando você apresenta argumentos ambientais. As pessoas vão acreditar mais em você se você deixá-las saber que não é perfeito, mas que está tentando fazer as coisas certas, e que vai continuar melhorando. Isso faz as empresas parecerem mais humanas.

Quais problemas ambientais as companhias deveriam atacar primeiro?
A mudança climática é uma questão central para os negócios. Enfrentar as alterações climáticas exige que as empresas simultaneamente enfrentem muitos dos males ambientais do mundo: energia, poluição do ar e da água, exploração exagerada dos recursos naturais, agressões à biodiversidade e muitas outras coisas.

Compensar emissões de carbono com o plantio de árvores é uma boa estratégia de marketing?
A compensação, como uma estratégia de marketing, tem perdido seu apelo. As pessoas estão começando a compreender que simplesmente assinar um cheque para plantar árvores realmente não significa muito em relação ao volume de todos os gases estufa emitidos para operar um negócio, incluindo viagens de avião, transporte para o trabalho e o uso de gás, energia e água. Empresas que utilizam isso como a sua única estratégia de marketing acabarão sendo criticadas por ativistas e outros grupos. As compensações têm seu espaço, supondo que a empresa já esteja seriamente engajada em tomar medidas para aumentar a eficiência e usa energia e combustíveis renováveis sempre que eles estejam disponíveis. Depois dessas providências, aí sim faz sentido compensar as emissões de algum uso de energia remanescente.

Como o seu livro mais recente, Estratégias para a Economia Verde, pode ajudar as empresas? 
O livro é uma coleção de minhas experiências e percepções após 20 anos de observação da "ecologização" dos principais negócios, juntamente com conselhos sobre o que funciona e o que não funciona. Eu ofereço perguntas-chave que as empresas deveriam se fazer. O que você sabe? Você compreende plenamente o impacto ambiental gerado pela atividade da sua empresa? A maioria das empresas não compreende e é muitas vezes surpreendida com o que descobre. Em alguns casos, seu maior impacto não é nada daquilo que se estava pensando. O que você está fazendo? Agora que você sabe qual é o seu impacto, você tem um plano definido para fazer algo em relação a isso? E esse plano é parte da estrutura da empresa - aprovado pelo CEO, com todas as políticas relevantes e os indicadores de desempenho discriminados? O que você está dizendo? Você está falando sobre o seu impacto ambiental, realizações e metas para os seus diversos públicos - funcionários, clientes, fornecedores, jornalistas, ativistas, investidores e outros? Não apenas se vangloriando das coisas que você está fazendo certo, mas proporcionando contexto, inclusive divulgando as coisas em que você ainda está trabalhando? Acredito que, se uma empresa pode demonstrar que conhece seus impactos, que tem um plano definido para fazer algo em relação a isso e que está se comunicando honestamente com o mercado, ela será respeitada e acreditada e terá os alicerces para prosperar na economia verde. No meu livro, reflito sobre isso e conto histórias de empresas que conseguiram prosperar e de outras que não conseguiram.

Como as empresas brasileiras podem participar do mercado verde internacional?
Meu conselho é o mesmo para as empresas em todo o mundo: faça bons produtos que as pessoas querem comprar, responsavelmente desenvolvidos e fabricados. Venda produtos que melhorem a vida das pessoas e que sejam feitos de materiais que não prejudiquem o planeta. Existem grandes mercados ao redor do mundo para empresas que possam fabricar produtos de todos os tipos dessa maneira.

O senhor tem trabalhado há mais de 20 anos para empresas como Levi Strauss, Coca-Cola e General Electric. Qual é o balanço desse trabalho? O que essas empresas fazem de relevante em sustentabilidade?
A questão não é necessariamente o que essas empresas fazem, mas como elas fazem. A Levi Strauss, por exemplo, fez extensos estudos dos impactos ambientais de um par de jeans, desde o cultivo do algodão, sua fabricação e venda até o seu uso pelos consumidores. Eles descobriram que um dos maiores impactos ambientais dos jeans aparece quando os consumidores usam água quente para lavá-los. Agora, eles estão trabalhando na criação de um jeans que pode ser facilmente lavado em água fria. Isso significará economia e redução do uso de energia para os consumidores. É uma nova forma de pensar - sobre o impacto total dos produtos, mesmo depois das vendas. Empresas que são capazes de fazer isso muitas vezes são capazes de criar produtos que não são apenas ambientalmente amigáveis - eles são os melhores. E isso é uma receita para o sucesso.

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