Marili Ribeiro
Um show de Caetano Veloso em petit comité seguido de jantar. Um show de Rita Lee em área aberta com mais de três mil pessoas. Uma apresentação do enólogo-cantor Ed Motta acompanhada de degustação de vinhos. Um bufê com delícias requintadas, como ovas de salmão e boeuf bourguignon, preparados pelo chef francês Emmanuel Bassoleil. E ainda uma série de espetáculos com a Turma do Cocoricó para crianças.
A lista acima não é uma relação de eventos patrocinados por cervejarias ou instituições financeiras para promover suas marcas, como reza a tradição no ramo. São ações de marketing desenvolvidas nos últimos tempos por construtoras e incorporadoras para vender imóveis residenciais. A intenção tem sido a de cativar compradores para unidades com valores que oscilam entre R$ 300 mil e R$ 5 milhões, dependendo da área e da localização.
Nunca na história do setor imobiliário se caprichou tanto, nem se aplicou tantos recursos, para atrair atenção para o negócio. 'Acabou a era das velhas Kombis estacionadas com placas e setas indicativas dos empreendimentos nas redondezas', brinca Romeo Busarello, diretor de marketing imobiliário da Tecnisa - embora promotoras ainda permaneçam nas redondezas dos empreendimentos convidando o público a visitar os estandes de vendas.
'Os investimentos em propaganda e marketing vêm crescendo com o uso de mídias alternativas em busca de se ampliar a comunicação do negócio, porque o setor imobiliário ganhou nova dimensão para a economia nacional', diz Ubirajara Spessoto, diretor de incorporações da Cyrela.
Uma projeção dos gastos com ações de marketing feita para este ano, considerando apenas as dez maiores empresas no ranking do segmento - onde se situam Tecnisa, Cyrela, Camargo Corrêa e Gafisa, entre outras -, aponta para algo em torno de R$ 480 milhões. Uma verba a ser aplicada não só nos tradicionais anúncios e comerciais impressos, como também em entretenimento nos locais de venda, assim como em sofisticados estandes com áreas de lazer para crianças. Isso sem falar nos elaborados catálogos dos lançamentos, que mais se assemelham a catálogos de arte.
A conta, para se chegar a ao montante aplicado, é simples: as dez líderes do segmento passaram a reservar entre 5% e 6% da receita total gerada com as vendas em marketing. Em 2007, a previsão é que elas faturem R$ 8 bilhões.
Somente nos dois últimos anos, 16 empresas do setor entraram no mercado acionário. Boa parte do dinheiro injetado na movimentação desse negócio veio de fundos de investimento estrangeiros. A participação desse capital passou a exigir maior transparência na atuação das construtoras e incorporadoras no País, com práticas de governança corporativa e apresentação de balanços trimestrais. Um dos efeitos dessa mudança tem sido a estruturação das áreas de marketing, antes até inexistentes.
Além dos recursos abundantes - as incorporadoras e imobiliárias levantaram R$ 11 bilhões na Bolsa de Valores -, o cenário do segmento foi favorecido pelo aumento da oferta de crédito para a compra de imóveis.
A conjunção dessas duas variáveis - dinheiro e crédito - tem feito o volume de empreendimentos mais que dobrar. E, por conseqüência, a disputa pelo consumidor mais acirrada.
O fenômeno já está registrado no balanço dos investimentos publicitárias no ano passado ante o anterior. Dados cruzados a partir da combinação de volume de recursos do setor, colhidos pelo Ibope Monitor, com os estudos do Projeto Inter-Meios, que baliza o meio publicitário, exibem uma variação positiva de 26% no aumento da verba publicitária do setor imobiliário em 2006 ante 2005. A Cyrela, por exemplo, apresentou crescimento de 112% no período, e a Gafisa aumentou 36% os seus investimentos em publicidade no ano passado. Empresas dizem que, hoje, inovação é fundamental'.
A gente vende mais do que um apartamento, a gente vende um sonho que o comprador vai realizar somente em três anos quando entregarmos a obra', diz Roberto Perroni, diretor-superintendente da Camargo Corrêa Desenvolvimento Imobiliário. E, segundo ele, para vender sonhos é fundamental um marketing sedutor.
É o que a empresa vem fazendo num projeto em um bairro até então abandonado - a Vila Andrade, uma extensão do Morumbi na zona sul de São Paulo. Para esse projeto, a Camargo Corrêa recorreu ao glamour das músicas do maestro Tom Jobim, cujos nomes batizam os condomínios que constrói na área.
Para obter a autorização da família, a empresa empenhou-se no desenvolvimento de um projeto que conta com três praças com mais de 20 mil m2, já que a natureza era uma paixão declarada do maestro. Mas também investiu em calçadas ecológicas, com maior absorção das águas de chuva - são cerca de 4 quilômetros na Vila Andrade. No final do projeto, serão cerca de R$ 15 milhões em infra-estrutura. Tudo isso para realizar cerca de R$ 1 bilhão em vendas em duas mil unidades.
Com tanta oferta qualificada, chamar a atenção requer cada vez mais criatividade. 'Sabemos que disputamos a atenção do comprador no fim de semana, e tínhamos de oferecer atrações no estande que distraíssem os filhos enquanto os pais avaliam a compra', diz Julio Cesar Gomes Pedro, diretor de Marketing da Gafisa.
Daí a instalação por não mais de seis meses de estandes que são verdadeiros parques de diversão para crianças, com shows infantis e profissionais especializados para cuidar da gurizada enquanto os pais estudam os planos da nova moradia. Espaços que têm áreas de café e e simulação de variações de plantas de apartamentos. Só esses estandes chegam a custar R$ 3 milhões.
'O marketing do setor imobiliário estava tão parecido, com a mesma linguagem visual que o consumidor já não prestava mais atenção', diz Maurício Magalhães, presidente da agência Tudo, do grupo YPY, que se dedica a montar eventos para a Gafisa. 'Era fundamental mudar.' E para isso, as grandes empresas puseram a mão no bolso. De palestras de figuras renomadas - como jogadores de basquete, treinadores esportivos, chefes de cozinha ou autoridades em moda e boas maneiras - até show musicais, vale tudo para vender imóveis hoje.
23/07/2007
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